Corpo e Morada I

Onde mora minh’alma

É onde quer que eu esteja

Na rua, na casa ou numa igreja…

Porque se um dia achei que residência fixa jamais terei

Ahá, meu amigo, aí sim eu vi que me enganei.

Sempre pensei que lar fosse sinônimo de morar que fosse sinônimo de ficar que fosse sinônimo de residir

Com o tempo, fui entendendo que lar é sinônimo de estar que é sinônimo de passar que é sinônimo de existir

Lar, é onde quer que eu me encontrar.

Brasil, Canadá, Holanda, Alemanha, França, Itália e Austrália

Na casa de outra família, sozinha num cômodo, na mesma cama que uma amiga, numa casa com 10 pessoas, num quarto com ateu e muçulmano, em um conteiner, numa quitinete compartilhada, ou em grandes apartamentos

Tudo isso eu já vivi

-inclusive por longos períodos-

Mas em casa sempre me senti.

Porque não é (só) o mar que vai definir aonde meu espírito vai restar!

Mas… se a vida é feita de matéria… será que essa história de eu querer me expressar é séria?

Com que frequência pulsa a minha artéria?

Porque, sim, eu tenho o desejo, de refletir meus pensamentos, em um plano físico, material, aonde eu possa domir e acordar, sem me preocupar, se acaso eu consegui me fazer ser vista

Entendida

Lida

Com a minha identidade devidamente compreendida.

Quero botar meus gostos pra fora!

Exaltar minha visão de mundo

Meu ideal de beleza e aquilo que eu prezo como realeza.

Quero criar a minha residência.

Física!!!

Com mesa cadeira e sofá

Viver a arte do wabi-sabi e ouvir hip hop enquanto eu tomo chá.

É pra isso que eu vivo

Porque home is wherever I’m with me

so may my home be a reflex of me.

Quebrando as regras de casa

“Ela é contra as regras”

Hmm, na verdade eu vivo sob as minhas próprias.

Sobre casa|mento.

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Você já parou pra pensar na diferença entre normas impostas pela natureza X normas impostas pelo homem?

Naquelas eu acredito, nessas já nem tanto…

Por mais que eu não saiba explicar à fundo (pois meus conhecimentos matemáticos são, de fato, limitados) eu sei que 2+2=4 e que há alguma explicação racional por trás disso, a qual ninguém nem ousa contestar.

Não por falta de vontade né, mas porque 2+2=4 e ponto.

Agora, (indo direto ao ponto) uma união formal de casal (lê-se casa/mento), por exemplo, eu já não diria que é uma norma imposta pela natureza.

Tem como impedir que aconteça? Escolher como e quando? Tem uma explicação lógica incontestável? Não.

Não, não é algo natural, que deve realmente acontecer simplesmente porque é assim que as coisas funcionam.

Essa é uma norma imposta pelo homem, digna de contestação e reflexão. E digna de interpretação também, na minha opinião.

Vamos lá, o que casamento significa pra você?

a. Juntar as escovas

b. Fazer uma bela cerimônia

c. Assinar um papel

d. Usar um anel

e. O enfrentar os desafios do tempo + dia-a-dia de um casal que curte a companhia um do outro

Todas as alternativas acima são corretas, você é livre pra escolher aquela que mais te representa.

Mas | eu | vou de e.

Pra mim, o significado de casamento depende do contexto, e, na minha opinião, significa escolher conscientemente abrir mão da minha individualidade para compartilhar uma parte do meu ser com alguém que eu amo, e ser grata por essa pessoa escolher se compartilhar comigo também.

É se adaptar, aceitar as diferenças, abraçar as vulnerabilidades, aproveitar a companhia, torcer pelas vitórias, superar o desafios, dar e receber amor. Do outro, pelo outro.

Para mim, não é sobre uma regra, uma ordem, um momento único que nunca vai voltar, algo que só acontece uma vez na vida.

Pode até ter uma ínfima parte minha que ache isso também (somos todos complexos ok). Mas, com certeza – para mim – não é majoritariamente sobre isso.

Eu, pessoalmente, tenho a sorte de viver um casamento com alguém querido há muito tempo, e não preciso de uma data no calendário ou um papel oficial para me dizer se sou ou não “casada”.

Sim, tá tudo mais do que muito bem precisar de uma data, querer ter uma cerimônia, achar que vai mudar algo depois do dia marcado. Acho lindo! Um dia eu também vou querer celebrar a minha união.

Mas só porque sim. Para me divertir, porque estamos afim.

Não pra seguir uma ordem, não porque é assim que tem que ser, não porque existe um relógio invisível contando um tempo supostamente limitado.

O que significa 10 anos se a vida acontece todo o dia?

Não curto falar muito sobre esse tema – principalmente em primeira pessoa – porque tem gerado bastante polêmica com os meus familiares nesse momento de pressão rs, mas sinto que preciso expressar minhas ideias porque pode ter outros aí como eu questionando essa história de ordem, e “tá na hora” e blablabla – quem disse que não vou ter filhos antes de “casar”?

Às famílias, parem de pressionar os cosanguíneos. Parem de dar tanta importância à algo que, no final das contas, o dia seguinte é só o dia seguinte! Eu sei que é porque você quer viver esse momento, mas haja paciência aí

À você que escolheu a alternativa e, continue seguindo suas próprias regras. Faça o que/quando tiver vontade, da forma que achar melhor.

À quem escolheu a/b/c ou d, você está certo e seja feliz! Siga sua visão de mundo e tenha uma vida linda ❤

Porque no final das contas, a beleza do casamento ser uma instituição criada pelo homem é a (via de regra) liberdade de escolha. Seja lá qual for a sua opção, eu vou comemorar junto contigo e me sentir realizada por você estar realizado

Agora, quando se tratar da minha liberdade de escolher, eu exijo o meu direito de exerce-la.

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Será que um dia vou mudar de opinião? Curiosa.

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Foto: Sardenha, Itália

Um convite ao dinamismo

Já morei em diversos lugares – fisicamente, e mentalmente.

Já vi, já conheci, e já senti muita coisa que só quem nunca sentiu não sabe como é. Carrego uma bagagem que só eu sei a quantidade absurda de itens que nem cinco mochilas conseguem comportar. É história, atrás de história, atrás de…

Não sei, devo ter feito um pacto comigo antes de nascer. Desde que me conheço por gente carrego uma máxima pra onde quer que eu vou: estou aqui para viver experiências. Isso é meu leme, meu guia, meu barco, meu passo.

It’s all for the sake of it. Todas as minhas escolhas e decisões são pautadas em cima disso.

Eu me recuso. A viver uma vida só. Durante uma vida inteira. !!!!

Pronto falei. Não faz sentido e quem concorda respira.

Tá, tudo bem, quem não concorda pode respirar também. Mas eu te aconselho fortemente a concordar.

Porque a gente não desceu no tobogã pra viver 10 dias, 1 mês, 2 anos, 10, 20, 60, 100 anos e ser a mesma pessoa até a hora de voltar, galera. Sério que ceis não acham?

Na minha (realmente humilde) opinião, não tem roteiro, não tem ordem, não tem certo, não tem errado. A beleza está em cada um viver a vida do jeito que achar melhor e no fim do dia todo mundo se reunir pra tomar uma cerveja e comemorar a liberdade.

Já entendi que meu objetivo ao longo dos anos é fazer a minha presença neste planetinha água ter significado, e deixar valores aos meus próximos em gratidão aos que foram deixados a mim por quem pisou aqui antes. Sei que aprendo muito com cada pessoa que eu me relaciono, e acredito que o nosso pão de cada dia se encontra exatamente nesta troca (seja ela boa ou ruim hein).

Já entendi que eu quero sim deixar um legado, e ele basicamente se resume na frase “Viva experiências“. As que você quiseeeeer, pra mim realmente não interessa. Só viva, se permita sentir tudo e ser alguém novo nos pequenos detalhes de cada dia. Procure estar constantemente se reinventando (se enxergando com novos olhos), e se abrindo para as possibilidades que florescem a cada respirada profunda na barriga.

Pronto, tá escrita a carta pros meus futuros filhotes. Se eu morrer antes alguém imprime esse parágrafo e entrega pra eles por favor? (sério)

Você não é meu filho (grazadeus senão já ia ganhar umas chineladas só pra ficar experto)* mas o parágrafo acima também se aplica a te. Sim, hoje a tia veio sincerona e com um recadinho importante pra todo mundo: tá liberado viver uma vida dinâmica!

Tá liberado casar só depois de ter filho (eu quero!), morar de aluguel na adulcência, se mudar 256 vezes, comprar uma casa só aos 50 anos, ser fã de Luiza Sonza (desculpa, esse não tá não), mudar de profissão 7 vezes… sei lá, meu anjo, você que escolhe. A vida é suaa, olha que demais!

Eu nem consegui me secar hoje direito porque esse texto brotou na minha cabeça no meio do banho e eu tive que sair correndo pra começar a escrever (sim, é assim que o grande processo criativo do Abre a Janela acontece).

Os textos vêm quando a vida tá me dando um sinal de vida, mas talvez também tenha sido ela materializando algo pra você ouvir isso hoje, será que não? Ouçam a palavra do universo, irmãos.

Falando sério agora, eu não quero ter esquecido de secar minhas costas e molhado a casa inteira à toa. Não estou aqui pra falar de mim, mas pra nos lembrar que nada é/precisa ser estático ou roteirizado. Retire algo de valor, pense naqueles sonhos que ficam só debaixo do travesseiro, olhe pra sua zona de conforto, e… na moral…. mete-lhe um pé na bunda da dixgraçada.

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*PS: não dou chineladas em ninguém e sou completamente anti-violência, que fique claro. A frase tá ali só para humor e já to pensando em mudar também mas vai acabar ficando assim, aceitem

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Foto: Antibes, França.

Piadinha de mau gosto

Rosas são vermelhas, violetas são azuis, hoje eu acordei, puta revoltuis.

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Não é todo dia que se acorda dançando pelo bosque em um dia ensolarado ao som de belos passarinhos, flutuando sob uma brisa leve matinal e com cheiro de café quentinho.

Tem dias que se acorda em um belo dia ensolarado com café quentinho passado, um passarinho ou outro cantando lá fora e uma brisa leve matinal – mas emputecida. Não se quer nem saber de dançar pela casa quem dirá pelo bosque. Parece que há um piano sendo carregado nas costas e não se acha força nem pra levantar o braço e pegar uma xícara sequer.

5 minutos sentado 5 minutos deitado. “Bora trabalhar” se resume à “bora scrollar” que se resume à “bora deitar e vegetar”

Forças obscuras do além fazem o favor de prestar uma visitinha na vizinhança da mente e ficar brincando de batata quente com a gente.

Ou será que a gente brinca de batata quente com nós mesmos?

O fato é que Mario acordou com vontade de socar o armário e sair gritando pela rua como se não houvesse amanhã.

Cansei, diz ele. Cansei dessa palhaçada chamada Mario. O autoboicote é real e ele tá ai, cai mesmo quem não quer.

O que será que dias emputecidos querem nos ensinar? Porque, assim, sabemos que não somos pessoas puta revolts. Em geral, gostamos – e muito – de dançar bosque à fora. Mas em dias como estes parece que nada faz sentido e só o que queremos é jogar tudo pro ar e sair correndo pra se encolher em um banco aleatório na baia de Hobart.

Mas agora, depois de -verdadeiramente- sentir toda essa revolta, eu tenho um palpite: piadinha de mau gosto. Neste caso, uma puta piadinha de mau gosto do universo. Tão grande que consigo imaginar perfeitamente esse cosmos rindo da minha cara, com a barriga doendo de tanto rir e ficando quase sem ar de tanta gargalhada.

“Só pra sentir o gostinho”, diz ele. “Mas ainda não”, conclui.

Puta piadinha de mau gosto, se eu te contar você nem vai acreditar.

Porém entretanto todavia e contudo, depois da tempestade sempre vem a calmaria. Bola pra frente, corre que da próxima vez é pra comer o prato todo em vez de ficar só na vontade.

Corre que lá trás vem gente, mas não esquece de desviar.

Se você, assim como eu, um dia já teve o claro sentimento de que o universo estava pregando uma peça com a sua pessoa e te fez se sentir protagonista de uma grande piadinha de mau gosto, saiba que… é nóis.

Mas saiba também que por traz de toda peça de teatro sempre tem uma narrativa, uma espécie de moral. Tente absorver toda a sabedoria que seu coraçãozinho aguentar, e aceite o fato de que o universo tem sim o poder de te colocar na posição de batata dentro do joguinho do quente. No fundo, é só uma didática alternativa de nos fazer maiores ainda e nos levar ao próximo nível de joguinho com mais, digamos assim… classe.

Mais experientes.

Não, não tente se vingar da jornada nem de ninguém a sua volta. Essa não é a mensagem. Assim, desatrelado ao sentimento de vingança, a mensagem que fica é:

um dia da caça, e outro do caçador.

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Foto: Estocolmo, Suécia.

Esconde-Esconde

Sentimentos escondidos,

Hoje eu me peguei pensando sobre sentimentos escondidos. Aqueles que moram nas profundezas do coração, nas águas mais turbulentas e difíceis de navegar.

É lá que ficam as memórias, sentimentos, e emoções que não quero pensar. Nem sentir, nem me emocionar. No dia-a-dia eu não sinto, nem choro, nem rio. Apenas esqueço e tento não lembrar.

Sentimentos escondidos. Como o tempo é relativo?

Dois flamingos caminhavam no deserto em busca de água. Depois da ninhada, o bando iniciou sua jornada em direção ao lago para alimentar seus filhotes. No meio do caminho, dois flamingos se conheceram. Um percebeu o outro no meio da multidão, e seus olhares se cruzaram. Foi o que bastou. Mil sentimentos floresceram

História turbulenta. Final feliz? E o tempo levou…

E o tempo passou. Sentimentos escondidos, de onde vem e porque se escondem? É proteção? Indiferença? Escrevi mil cartas e nenhuma delas me trouxe uma resposta,

Ah, essas emoções que se escondem. Eu daria tudo pra ter um momento de conversa e entender o que elas tem a dizer. Iria eu gostar? Me decepcionar? Ter a certeza que é o que parece ser?

Vamos dançar enquanto é tempo.

Tempo… será que dá tempo? Falta quanto tempo?

Se é que um dia vou ter um momento de conversa com o tempo. O que ele quer me dizer?

Já sei a resposta mas não quero ouvir. Vou fingir que é outra coisa e curtir o sentimento que essa imaginação me traz

Se não tenho vou fingir que tem

Sentimentos escondidos? Quais dos seus apareceram?

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Foto: Céu de Kalibo, Filipinas

Years and Years

Faz um tempo – anos – que eu não curto curtir o Instagram.

Para você que está lendo isso no futuro, quando eu já me tornei uma versão fake da Clarissa Pinkola Estés, Instagram é uma rede social muito usada durante os meus anos de juventude, aonde a galera posta(va) fotos de seus gatos e amigas com duck face e selfies de espelho na balada – também tem a clássica na academia, né?

Me lembro de ter começado a usar Instagram em 2011, no auge da minha adolescência. Era muito maneiro e divertido, mas de lá pra cá muita coisa mudou. Antes, os filtros do Insta eram péssimos e as fotos ficavam piores com do que sem. Era demais!

Hoje, é surreal a -perfeição- que o filtro deixa em uma foto.

Eu me odeio por usar Instagram e ainda não conseguir me libertar da rede. É um papo clichê esse, frase repetida por muita gente, mas é verdade.

Atualmente, meu feed deixou de ser um lugar para olhar fotos aleatórias e virou uma propaganda de televisão e plataforma de autoafirmação/autoimagem absurda. Parece que toda e qualquer publicação do meu mural é alguém, seja pessoa física ou jurídica, se promovendo ou divulgando seus serviços. Viramos escravos da ditadura Instagraniana.

De certa forma, escravos mesmo. Muitos queremos deixar de usar as redes, mas não conseguimos. Principalmente quem depende financeiramente da rede, há várias regrinhas para que uma publicação atinja um alto número de pessoas e se torne mais visível e conhecida. Não quero fazer uma analogia simplória à escravidão, mas é algo a ser pensado.

Pra mim, é triste. É triste ver, na prática, quão maior é o engajamento das pessoas em posts sem conteúdo algum. Como modinhas do Instagram são tão sem sentido. Por quê você iria querer se parecer com alguém?

Por que você iria se parecer com alguém que, de diferente, só muda o valor da conta bancária. E a quantidade de pessoas que (acham que) te conhecem.

Sinceramente, esse negócio de Instagram tá me cansando.

O mais louco dessa minha irritação é que daqui a pouco vou estar lá olhando meu feed do Instagram. Olhando vídeos desinteressantes de pessoas que não se tornaram tão interessantes ainda. Investindo o meu tempo em nada de valor. Muito provavelmente, também sendo uma pessoa desisteressante para outros, que vão olhar minhas postagens e pensar que eu não me tornei tão interessante assim.

E se daqui a pouco eu começar a usar o instagram pra me autopromover também? O Abre a Janela tem instagram – @abre.janela. Segue lá!

Esse post não tem nenhum objetivo a não ser um espaço para eu desabafar. Mas o objetivo desse post também é te fazer pensar.

Todos caímos na rede e agora somos peixes. Como acabar com a pesca predatória?

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Foto: Ilha Sul – Nova Zelândia

Diga “Xis”

É sobre dar tempo ao tempo. Nada além de paciência para esperar o tempo tomar o tempo necessário para agir, no seu tempo.

Imagine uma parede branca com pequenas fotos penduradas nela. Tem muitas fotos, com todos os tipos de cores e amores, bem pequenas, estilo Polaroid. Cada foto representa um acontecimento diferente na sua vida.

Sabe quando a gente decide escolher umas fotos pra revelar e botar em um álbum físico? Se imagine olhando e selecionando aquelas que mais te lembram bons momentos. Vai pegando as fotos com pessoas especiais, lugares que amou, dias perfeitos. Dá uma risada só de lembrar do dia que pintou o cabelo de roxo e fez uma tatuagem de picolé (uma não, várias) no braço (inteiro).

Experimenta deixar essas fotos em stand-by e revelá-las só no ano que vem. Você irá ficar chocado com a quantidade de fotos que deixará de lado, pois não parecem mais ser tão especiais assim. A vida mudou, a amizade com aquela bff acabou. “Nossa como eu era feia” – vou revelar pra quê?

Você mudou. Hoje, você está à algumas mudanças de atitute de distância daquele ser com cabelo justin bieber do passado.

Mas, o que mudou? A impressão que dá é que aquelas fotos já não fazem mais sentido. “Nessa foto eu estava passando por uma desilusão amorosa, e lembro que foi um período difícil pra mim. Por que revelar?”

Imagine uma parede branca com várias pequenas fotos Polaroid penduradas nela. As fotos estão em ordem cronológica, e uma de um dia diferente do outro. A primeira foto é você neném (parece que essa fase nem existiu, né?), passando por você criança, aborrecente, jovem adulto, morando em um puxadinho de madeira no quintal dos pais, agora noivo, foto do casamento, foto do primeiro filho, do segundo, até chegar em uma foto de você ontem. Com a barba a fazer, olheiras, barrigudinho, usando uma camisa polo e um tenis nike shox. “Como eu era brega quando usava calça de veludo”

Na parede, tem 1 foto por ano vivido. 50 fotos. “Eu não quero lembrar da época que morei em um puxadinho de madeira no quintal dos meus pais, por mim nem revelava essa foto. Graças à Deus, hoje a minha vida é bem melhor.”

É louco como a gente não pensa que hoje eu só sou um senhor de 50 anos barrigudinho que usa camisa polo e um tênis nike shox no mesmo look porque um dia fui um jovem magricelo que usou cabelo até a cintura e calça de veludo grená.

Retire da parede a foto do puxadinho de madeira no quintal dos pais e junto seja obrigado a tirar aquela foto sua com a chave do primeiro apê em São Paulo. Deixe de revelar uma daquelas fotos que você separou no ano passado, e tenha um álbum de memórias incompleto.

Pois toda e qualquer situação que aconteceu no passado, seja ela boa ou ruim, te levou até aonde você se encontra. Cada uma daquelas fotos de cada um dos seus anos vividos, de cada fase de moda que você experimentou, formam a construção do seu ser, e são você, quer queira quer não.

Hoje, Clodoaldo prefere mil vezes morar em uma casa legal em São Paulo do que dividir um puxadinho com a falta de limpeza de um jovem adulto que mora sozinho. Mas Clodoaldo não pode jamais deixar de levar consigo a foto do barraco. Nem a da calça de veludo, e nem a do bebê que ele nem lembra que um dia já foi. Se não fosse por esses Clodoaldos do passado, o de hoje não seria nem a metade do que ele é.

Agradeça o você de ontem por se tornar o você de amanhã, e respeite a importância que ele teve neste processo.

“E aí semente, já nasceu?”

Era uma vez uma jardineira.

Quando criança, Shirley, a futura jardineira, não gostava de plantas. De flor, mais especificamente. De acordo com ela, flores eram objetos sem valor. Dar flor de presente para alguém, então, só mostrava o quanto a pessoa não gostava tanto assim da outra – um presente fácil e que, na verdade, não queria dizer nada.

Ela não admitia, mas para ela, flores eram tão maravilhosamente surreais e perfeitas, que acabavam se tornando feias e banais. Sabe aquela pessoa que você olha e pensa “Meu Deus, essa pessoa é tão linda e sem defeitos que fica até feia e sem graça”? Então.

A vida foi passando e Shirley virou adulta. Por puro e simples prazer de comer, e preguiça de ter que ir no supermercado comprar salsinha para depois de dois dias ela morrer de frio no fundo da geladeira, Shirley resolveu ter uma hortinha em casa. Comprou um vasinho de manjericão, botou na varanda, e lá deixou.

Mas Shirley tinha pena de comer o manjericão. Ele era tão cheiroso! “E se eu tiver botando muita água? E se eu comer tudo e ele não crescer mais?”. Pobre e ingênua Shirley.

O primeiro vasinho morreu de frio. O outro de sede. O terceiro de causas naturais, vulgo falta de sol.

Shirley cansou de matar seu manjericão e resolveu pesquisar mais sobre plantas. Algo dentro dela se conectou com o basilico e começou a enxergá-lo não só como um um alimento, mas como uma espécie de filhote, que precisava de cuidados para viver uma vida saudável.

A vida tem tanta sincronia que fez Shirley se tornar mãe de plantas na mesma época que ela se tornou mãe de si mesma. Deixe-me explicar.

Shirley criou uma horta a partir de sementes de diferentes plantas. Regou com carinho, cuidou delas e as esperou brotarem do chão. A maioria demorou meses pra nascer, outras brotaram rápido mas não deram frutos, e uma outra, que ela tanto ansiava, teve sua terra invadida por uma planta vizinha e não teve espaço pra nascer. Frustrada, Shirley até tentou plantar amor-perfeito algumas muitas vezes, mas a semente não deu nem sinal vida em nenhuma.

Porém, algumas sementes brotaram e se tornaram mudas exuberantes. De ficar parado admirando, quão lindo aquilo se tornou.

Porque a vida é assim. É uma crença pessoal, mas, na minha opinião, tudo que eu faço, por menor ou maior que seja, estou plantando uma semente. Que pode não dar fruto, que pode ser um fruto de uma semente plantada no passado, que pode ameaçar crescer mas não ir pra frente, que pode ser ofuscada por uma semente vizinha que eu nem sabia que tinha plantado, ou pode nunca nascer. Mas é uma semente que estou plantando.

Só isso já daria uma semana inteira de reflexão. Às vezes, a semente que eu plantei pode até nem ser pra mim, mas para benefício de alguém próximo. Outras vezes alguém pode plantar, sem saber, uma semente pra mim, ao fazer algo que me inspira. É muito pano pra pouca manga.

Plantando, nossa personagem super fictícia Shirley passou a entender o quão incrível é esse processo de ver suas sementes, filhas do seu próprio esforço, brotarem do chão. Quando se tem consciência desse processo, viver se torna muito mais leve. Fica mais fácil entender que sementes levam um tempo pra nascer, depois pra se tornarem mudas, e mais ainda pra dar frutos. Que morrer faz parte do ciclo, e que depois é só plantar de novo.

Hoje consigo esperar cada etapa com tranquilidade.

Além disso, se tem uma coisa que eu aprendi esse ano foi ouvir o que a natureza tem pra me falar. Ela é realmente um espelho da vida, e uma fonte de sabedoria infinita.

E eu vi isso na prática, com meus próprios olhos, dentro da minha própria casa. Esses tempos, comprei uma muda de taioba que era bem baixinha, e coloquei ela na sala. Percebi que estava precisando de luz, porque as folhas estavam ficando amareladas. Então, coloquei ela embaixo da janela do escritório.

A janela era mais alta que a planta, mas proporcionava uma boa claridade. Você, leitor, acredita se eu disser que as folhas da taioba criaram um mecanismo de adaptação e cresceram até a altura da janela? A folha amarelada que ela já tinha morreu, e uma nova nasceu, um pouco mais alta que a última. Essa também morreu, e uma nova nasceu, com o caule mais alto ainda. Esse ciclo foi acontecendo até ela chegar-à-altura-da-janela, e depois parou de morrer.

Isso não é simplesmente tão incrível? (!!!!!)

Mais que incrível, me ensinou uma lição valiosa. Se, para se adaptar, uma planta morre e renasce algumas vezes, até conseguir o que quer, porque eu não posso fazer isso também? Não só posso, como devo! Deixar uma versão nossa antiga morrer e nos tornarmos alguém melhor é um ciclo natural, que deve ser repetido até o fim dos tempos. Até eu conseguir o que eu quero, até eu me tornar quem eu quero ser, até eu chegar lá e descobrir um novo lugar que eu quero chegar.

Eu -juro- que a natureza fala. E ela me disse pra não ficar ansiosa e parar de ir conferir todos os dias se minhas sementes já brotaram. Ela me disse para ter paciência e continuar plantando várias sementes todos os dias. Disse ainda que cada uma tem o seu próprio tempo de crescimento, e que, pelo menos uma delas, vai nascer e dar frutos maravilhosos.

Amém

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Foto: Praia do Campeche, Florianópolis.

Vitimice

Não é que eu estou estou me fazendo de vítima, eu só acho que é injusto isso ter acontecido.

Porque, sabe, não é que as coisas não saem como eu quero, mas seria muito melhor se fosse assim do que assado. Não entendo porque isso aconteceu, parece que eu só atraio problema nessa vida.

As coisas sempre dão certo com todo mundo. O fulano tá ganhando dinheiro, a ciclana tá feliz no trabalho, a fulana se mudou pra Nova Iorque, mas eu, não. Parece que sou a única pessoa no mundo que não consegue viver em paz e ser feliz. Que saco!

Antes parecia tudo mais fácil, não é mesmo? As coisas iam acontecendo, e fluindo… Por que será?

Começo dizendo que é por causa do padrão de vítima. Viver em estado de vitimice é viver achando que tudo lá fora é o culpado do problema, e que o “mundo” vive contra nós. É botar a culpa lá fora, ficar procurando um alguém para apontar o dedo, e mudar de humor com base no que acontece ao redor.

Há uns dois anos, aprendi que a “a saída é pra dentro”. Entendi dentro como sendo (literalmente) dentro de mim, do meu ser, da minha alma, da minha mente. Enquanto que fora é o mundo fora de mim. Aquilo que não está dentro do meu ser, ou seja, o mundo físico, visual, genético, epigenético…

A vítima, ela depende dos acontecimentos lá fora. Ela fica feliz se algo de bom acontece, e fica triste se algo de ruim aparece. Ela sai daqui de dentro, se desconecta da alma – que é só bem-estar – e permanece apoiada pra fora da janela.

Sem perceber que, até certo ponto, ela mesma é responsável por criar as coisas lá fora, a partir do que vem aqui de dentro.

Sem entrar no conceito do 100% de responsabilidade, que é só pros fortes de coração, eu chuto com precisão que a resposta se encontra no padrão de vítima. Que tudo depende de como eu escolho ver/viver a vida: sendo uma vítima à mercê do que cai no meu colo, ou escolhendo, de antemão, como eu quero me sentir daqui pra frente, e projetando um futuro feliz pra mim.

É como se fosse aquela pessoa que reclama que não tem ovo em casa, mas não sai pra comprar uma caixa. Que não gosta do que faz, mas trabalha no banco há 10 anos. Que sabe que o/a parceiro/a não é bom, mas o/a ama demais pra deixá-lo e ser mais feliz que aquilo. Que tá sem dinheiro, mas tem medo de arriscar algo novo. Que…

Basicamente, que prefere continuar no conforto do desconforto, do que buscar o desconforto de um futuro conforto. E que, claro, tem argumento pra cada um desses tais desconfortos.

Estamos todos no mesmo barco. A sociedade que nos condiciona e nos educa para crescermos achando que é normal/legal agir em estado de vítima (que nem essa frase)

Mas, meu amigo, deixa eu te contar uma coisa. Quando a gente sai do vitimismo, uma coisa mais legal que a outra acontece. Abre-se espaço para a imaginação e para a chegada de coisas incríveis & maravilhosas & sensacionais. Já posso até sentir. A alma tem voz pra cantar e, com nossa estabilidade emocional no saldo positivo, trazer mais e muitas positividades. É o tal do good vibes only

E pra sair do estado de vítima, basta se perguntar: qual a lição que isso quer me ensinar? O que devo aprender com isso? Depois, é só seguir em frente.

Já ouviu a palavra do #goodvibesonly hoje? Bora olhar pra dentro e se comparar consigo mesmo! Nada de olhar pro lado, nem de se apoiar pra fora da janela. Bora se limpar do padrão de vítima e começar a assumir as devidas responsabilidades.

Como já diziam os antigos: a vida é bela, nóis que fode ela.

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Foto: Gordon’s Bay, Sydney – Australia

O tal do “quem sou eu”

O que me faz ser quem eu sou? Eu sou mesmo quem eu represento ser? Quem eu quero ser?

24 horas, 7 dias da semana. 365 dias por ano, essas perguntas dão o ar de sua graça. Eu sou mesmo quem eu penso que sou? Eu sou realmente quem eu estou sendo?

Será que, quando eu tinha 17 anos, eu era mesmo quem eu realmente era? Com a mentalidade de hoje é fácil olhar para trás e apontar os dedos. Julgar quem eu fui, dizer que fiz tudo errado, se arrepender, querer voltar, nostalgia, choro, impotência, frustração, conformação. Na semana seguinte, julgar quem eu fui na semana passada, dizer que fiz tudo errado, se arrepender, querer voltar, nostalgia, choro, impotência, frustração, conformação. Daqui três meses, julgar quem eu fui há três anos, dizer que fiz t…

E assim começa a disputa do quem sou eu construtivo contra o quem sou eu destrutivo. Qual predominará as emoções daquele ser?

Esses dias aprendi que depressão é quando a gente resiste em se tornar a nova pessoa que já somos. Sim, eu repito. De acordo com o que o aprendi daquele ensinamento, a depressão aparece quando já nos tornamos uma nova pessoa mas estamos com medo de deixar de ser quem a gente era. Permanecemos no luto entre a transformação do velho para o novo.

Sem entrar no mérito da doença e da dificuldade que pode ser sair dela, e se nos trabalharmos para aumentar nossa disposição para aceitar mudanças? Não, não é fácil, pois é mais confortável permanecer infeliz no conhecido do que aceitar a chance de ser feliz no desconhecido. Porém, é um trabalho diário e eterno que – eu garanto – fica mais fácil a cada dia.

Há dois dias, resolvi aceitar a mudança que evidentemente estava acontecendo na minha vida. Fui obrigada a alterar meus planos para esse momento, e, por mais que foi super fácil aceitar esta mudança, foi difícil conviver com ela. Mais uma vez, foi difícil aceitar que eu consigo enxergar, e sei, que é possível ser feliz nesse novo desconhecido, por mais que muitas trilhas neurológicas de paciência tenham que ser construídas agora.

Mas, vou te contar uma coisa. Assim que eu decidi me desprender do controle mental de controlar o meu futuro – de controlar como as coisas vão acontecer e o que vai acontecer – e simplesmente permitir que meu corpo me mostre o caminho, frutos desse esforço já brotaram!

Agora, me sinto brotando, e com fluidez.

Porém, entretanto, contudo e todavia…… o trajeto requer sentimentos negativos. O choro, impotência, frustração, e conformação são necessários. Graças à eles, me senti obrigada a me rever e me estudar infinitas vezes até entender aonde quero chegar. Cada reflexão de dor me trouxe claridade pra chegar até o prazer.

Volte ali em cima e releia o ciclo que surge ao apontar os dedos. O quem sou eu destrutivo começa a partir do julgamento em relação ao passado, enquanto o quem sou eu construtivo começa pelo choro e adiciona reflexão + mudança em sua fórmula.

Convido você a, hoje mesmo, se policiar para não tomar a rota destrutiva e, por livre e espontânea pressão, iniciar o ciclo do quem sou eu construtivo.

Se não está conseguindo encontrar saída, a solução não é questão da mente, e sim do corpo.

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Foto: South Island – New Zealand