“Sério, por que essa pessoa inventa de botar esse brinco aqui? Ah, eu não vou deixar que mexam no meu território. Eu sou a abelha rainha e essa cera é o meu mel.
Que nada irmã, essa aí nem nos notou. Passou a vida inteira nos olhando mas nunca nos enxergou. Nos fantasiou, endereçou, limpou, mas prestar atenção que é bom, nada!
Ah, pois é. Semana passada eu me revoltei e inflamei. Quero nem saber, por bem ou por mal eu reivindico meu direito de ser ouvida. Quando é pra saber dos outros a gente presta né, agora quando é pra saber de si não tem santo que lhe faça ouvir!
Ah, pois é. Quando é pra apoiar o Ray Ban a gente presta né, agora quando é aparecer no penteado a gente tem que se esconder. Quando é pra ouvir elogio a gente é toda ouvidos, mas quando a crítica aparece a gente finge que nem escuta. O que será que ele tava falando mesmo? Que não gostou? Peraí, não tô ouvindo”.
Hoje, enquanto minhas orelhas conversavam, eu percebi que elas estavam ali. Percebi que eu tenho uma orelha esquerda e uma orelha direita. Quando eu me olhei no espelho, lá estavam elas: duas orelhas. A direita estava quente como o verão, vermelha. Quase pegando fogo. A esquerda estava gelada, brisada, cansada. Cansada de não ser notada. Cansada de ser toda ouvidos. Cansada de ser manipulada.
Hoje eu finalmente percebi que eu realmente tenho duas orelhas. Uma esquerda, e uma direita. A direita estava gelada como água em temperatura baixa. A esquerda estava quente como água fervente. Aliás, faltou água quente. Eu moro sozinha e para resolver o problema da água tenho que ligar pro gerente.
Só mês que vem, disse ele. Enquanto isso, fica aí resolvendo o seu problema. Bebe uma Corona e fica em quarentena. Quem sabe assim você aprende, que, a gente quando é presidente, sabe de nada, inocente. Sabe de nada da gente.
Hoje eu percebi que eu escolho o que eu quero ouvir. O que eu quero ver. Como eu quero entender. Hoje eu percebi que meu corpo dá sinais. Sinal verde, vermelho e amarelo. Fica aí a reflexão.
É tanta coisa que passa despercebida na correria do dia a dia, né? Ou seria, ignorada? Adiada? Eu não tinha reparado nas minhas orelhas, mesmo elas estando ali desde que eu nasci. O que será que eu vou descobrir amanhã? Que esse tempo me permita evoluir.
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Foto: Tasman Peninsula – Tasmania