Serenichronicity

Serendipity

Synchronicity

O que eu te disse-te

Ato ou efeito de descobrir coisas boas por acaso

Atitude criativa de viver conforme a ação

Efeito sincrônico de criar por inspiração

Se acaso fui eu que me deixei na mão.

Serendipity

Realmente, What.A.Pity !

Não ter prestado atenção

nas cartas escritas pelo coração;

nas falas calientes do urro da intuição,

aquela que sempre me estendeu a mão.

Synchronicity

Realmente, how could I end up in Such.A.City

Que me criou, sustentou, batizou, transformou, irritou

e no final,

me aproximou…

Serenicity

Tão leve, serene e contente

Que vibra, sorria e sente

Tudo que visualiza na mente

Eh, minha gente… liberdade é um caminho sem volta

Apesar de que o apego dá uma grande sensação de aconchego

O conforto do conhecido desconfortável mi sembra quase como que um chamego

Tão resistente quanto um labaredo

Pesado, contudo, distante da serena realidade

da descoberta da serendipidade

de correr em plena liberdade.

Sinestesia

A vida é um emaranhado de fios energéticos

Ao redor do mundo, Invisíveis a olho nu

Sem velocidade média, distância limítrofe e nem tempo perdido.

Uns chamam de coincidência… outros de sorte, Deus, alinhamento, conexão ou vibração

Apenas uma perfeita resposta do inconsciente Aladim

Sync in

____

Sentado no chão, se via ali perdido no meio da escuridão.

Sem crédito no orelhão e segurando um chinelo na mão, Lucio sentia que tinha chego ao fim

Olhou prum lado, pro outro… pensou… onde estara esse tempo todo?

Se pôs de joelho a rezar.

“Pai, orai por nós os pecadores. Resistimos. Complicamos. Por que insisto em me negar?

Se um dia Tu dissestes que nada na vida é por acaso, por quê cazzo questo giorno si fa così troppo caldo?

Porque se Tu estivesse de fato presente no meio de nós, teria hoje soprado minha resposta aos quatro ventos.

Em vez disso, ó Pai, Tu insistes em me fazer pensar. Duvidar, que o céu é azul e que cigarro dá câncer

É verdade, ó Senhor, que fatos são apenas opiniões enviesadas?

De viés já chega a minha mente, que um dia faz frio e no outro tá quente

Que mistura paz com apatia e sincronia com sintonia

Sem perceber que, no fundo, a criação vem pura e simplesmente da sinestesia.

O que me dizes, ó Paíó,

das vezes que pedi orei rezei e sonhei, e tu não me respondeu?

Que me pusestes a crer até ver, sendo que eu só o que eu queria era ver pra crer

Tenho Te visto meio distante, ò Senhor, mesmo te sentindo tão de perto.

Só eu sei o que eu vivi, mas já vi o suficiente pra saber que quando Tu queres Tu se faz presente

Às vezes é essa a graça da vida?

Ou será que a vida é uma grande e alarmante festa na praça?

Festa essa que não se escolhe os convidados

Pelo menos não deliberadamente…

Quem foi que chamou toda essa gente?!

Eu juro, Senhor, que hoje eu não to contente

cont(m)igo

Mas amanhã hei de ficar

Agora que me pus a orar

e estou Te ouvindo cantar

que o que me resta a fazer

é me domandar

as perguntas certas.”

*

*

Foto: Purmamarca, Argentina

Sintaxe até dizer chega

Como eu criaria o amanhã… amanhã, se o amanhã chega antes de eu criar o amanhã… amanhã?

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Uma coisa é certa: tá todo mundo fazendo o melhor que pode.

Não me orgulho de antes, mas eu não sabia ser diferente. Achei que o que estava fazendo era o melhor que podia fazer. Sem nem saber.

Como uma forma de se proteger, a gente se tranca, se fecha, se amarra. Vira tabu, não pode nem olhar.

Quem dirá cantar

É difícil imaginar, que a vida sem pode ser, diferente do que foi.

Não vou mentir, aqueles que se entregam sabem o que estão fazendo. Admiro quem viva à base de vontades, quem cede à sedução de sentir o tesão de viver o momento.

Sexy é o contexto. É questão de opinião….

Sexy é o sentimento, tão intenso e visceral, irracional. É o desespero da espera de acontecer num agora. É paixão não materializada, fantasia criada, visualizada, vivida, contida.

Sexy é o irreal, aquilo que o próprio toque já diz tudo

Será que vale à pena calar a tempestade? O que essa força imoral de criação irracional está tentando nos dizer?

Porque… seria mais fácil se contentar com o incontentável seguro. Seria esse um processo reversível?

Qual

é

a minha

história?

Eu sei, possa contá.la como eu quiser. A interpretação faz parte da imaginação. Por que a necessidade de ser baseada em fatos reais?

Esses dias me peguei querendo descobrir todas as versões. Juntando umonte de opiniões e pontos de vista e perspectivas e relatos completamente parciais

Na busca incessante de catar todos os pedaços, entender por completo, juntar todas as peças e falar É ISSO!

Pensando na graça de fazer pirraça por não gostar da nossa desgraça…

Qual

é

a nossa necessidade

de entender 100% de tudo?

De falar EURECA! com vontade à beça de dizer EU SABIA que não tinha como errar ERA TUDO QUE EU QUERIA!

Vamos lá, ainda é tempo, ainda dá pra consertar, eu tenho fé que o jogo vai virar

____

Ei ei ei ALTO LÁ!

É daqui pra frente amigo, o que passou ficou meu amôu

Aprende, compreende e bola pra frente!

Tu fostes o que tu sabias ser. Quem tu deves ser para se tornar o que sabes querer ser?

Bota nas mãos de Deus mas não esquece de botar nas tuas também porque no fim das contas rezar sem fazer é esperar o que nunca vai chegar

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Foto: Les Halles de Paris

O sabor de caminhar com as próprias pernas

O sabor de caminhar com as próprias pernas

De não ser filho de ninguém

De não conhecer alguém

De se meter em uma área que se tem um total de 0 contatos

Ninguém pra pedir conselho, ajuda, indicação.

O sabor de não ganhar nada na mão.

O sabor de não ser fácil, de se sentir pra trás, incapaz

O sabor de um pão no débito e outro sonho no crédito

Meu Deus, o sabor de construir algo sozinho.

Com a força da mente, um coração intensionado, e uma paixão ardente.

O sabor de não sossegar por menos, de se virar nos 30, de chorar mas aceitar

De trabalhar incansavelmente, e seguir em frente.

Que privilégio ter passado tanto perrengue!!!

Quem também sente?

O. sabor. de. crescer. no escuro. é. inigualável.

De ninguém, na intimidade, realmente saber o struggle de verdade

E então, de chegar o momento, olhar pra trás e ver a distância percorrida

A minuciosidade com que a obra foi esculpida

A grandiosidade do que se foi criado aqui dentro

A beleza de ser um só com a vida

O orgulho de ser o artista

O momentum de sentir o art de vivre no canal

Meu Deus, o gosto de construir com as próprias mãos,

pura e simplesmente,

é realmente opulente.

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Foto: Paris, França.

Nota baixa no boletim

*Vamos lá… iiiinspiiiirooouuu…. e reeesss…já pirou.*

Poffttt (som de alguém jogando algo pesado no chão)

“EU NÃO SEI PORQUE AINDA VENHO NESSA TERAPIA!!! Parece coisa de louco isso aqui. Tô pagando pra tu resolver meus problema pô! Em vez disso tu tá me mandando respirar? Porra, Jones!”

“Por quê você está se sentido com raiva?”

“Sei lá, tu que tem que me dizer. Eu já venho aqui há 12 anos, tu sabe todos os detalhes da minha vida. Me diz o que tá acontecendo comigo!”

“O que você acha que está acontecendo com você?”

“Cara. Eu não quero nem saber o que tá acontecendo comigo. Eu só quero que isso pare. Que essa coisa horrível que eu sinto O TEMPO TODO suma, e que eu consiga tomar um breja de boa sem me preocupar com nada.”

“O que é essa coisa horrível que você sente?”

“Porra Jones, não sei irmão. É uma parada pesada, tá ligado? Começou quando entrei na facul de contabilidade, e desde então essa porra não me larga mais. Eu consigo viver de boas, pá, mas se eu paro pra pensar a minha mente me tortura. É culpa, tá ligado. Raiva. Ódio.

Quando eu vou pro Jiu, parece que nada mais importa. Me sinto numa paz, mano. O tempo voa, eu me divirto com a galera, ensinando a molecada a dar uns golpe maneiro. Eu amo essa porra, velho. Sinto que eu sou bom no que tô fazendo ali, sabe?

Esses dias ganhei um prêmio de professor revelação de um campeonato brasileiro. Eu trabalho voluntário com crianças carentes, tá ligado? A meninada se amarra, eu me divirto, e no fim a aula acaba sendo top!

Mas quando eu vou pro trampo tudo muda, cara. Me sinto um bosta, fazendo coisas bosta, pra ver um dinheirinho meio bosta cair na conta no final de mês.

Eu não quero mais isso, mano. Cansei dessa porra! Não sou feliz no trampo.”

“E o que você vai fazer em relação a isso?”

“Eu? Ué, nada né. Eu tô tentando resolver um problema agora, que é esse sentimento maldito de tristeza dentro de mim. Não tenho tempo pra sair da contabilidade e viver a vida dos sonhos trabalhando com o que eu amo.”

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No dicionário, problema é:
1. assunto controverso, que pode ser objeto de pesquisas científicas ou discussões acadêmicas.
2. questão social que traz transtornos e que exige grande esforço e determinação para ser solucionado.

Assunto controverso… questões sociais que trazem transtornos. Transtorno de rota? Ou seria questões controversas sobre assuntos sociais (?)

Quando estamos na escola, o professor mede o resultado de uma aluno de acordo com a sua capacidade de resolver problemas ou questões em uma prova. Quanto mais perguntas o aluno conseguir responder, maior a sua nota.

Não que eu seja muito a favor desse sistema de provas, mas no final ele acaba sendo uma mímica da natureza de ser um ser humano.

E atire a primeira pedra o adulto que não continua tirando nota baixa em várias provas ao longo da vida. Eu ouvi todos nós?

Tô vendo até meu boletim escolar de 2021:

*capacidade de focar na solução de (insira um desafio específico aqui): nota 0.

Mas a verdade é que encontrar a solução é simples, basta a gente se estudar. Tudo tem resposta, se fizermos as perguntas certas (ou começarmos com uma pergunta pelos menos), e nos esforçarmos pra respondê-las. E aceitar as respostas.

E você, o que vai fazer em relação a isso?

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Foto: Queenstown, Nova Zelândia.

Mademoiselle

Sete mulheres encontravam-se na varanda de uma casa branca de madeira. Uma delas disse: “Silêncio, tenho uma coisa a anunciar!”.

Silêncio.

“O que foi?”, perguntou Madame. Madame era feia que só vendo, não sabia cantar e quase nem respirar. Tinha pinta na orelha e cintura de camelo. Mas era filha do pastor da vila – o dono da coisa toda – então era muito cortejada e havia diversos pretendentes correndo atrás de si.

Madame havia nascido prematura. Quando sua mãe deu à luz, não sabia se quem vinha era homem ou mulher, e por isso não sabia nem o nome. O pai queria mulher.

“A partir de hoje, vou virar selvagem!”, respondeu Syrlêi.

“Selvagem como uma noite de super lua.

Vou destruir minhas amarras ao passado, minha pose de boa-moça. Na escola, aprendi com meus pais que é importante ser educada e agradar o moço, usar o guardanapo no colo, cumprimentar quem eu não quero e não ouvir conversa de adulto.

Mas a vida… qual é o sentido? Se não tem nada lá fora, a quem eu estou tentando agradar além de eu mesma?

Será que é educado ser educada, ou será que o educado é falar o que pensa? Ser autêntica. Concordar pra agradar ou concordar em discordar?

Por quê será que nos é (mal) educado que ser educada é o educado?

A partir de hoje, vou virar selvagem.”

Shivete não gostou do que ouviu e achou que a moça tinha ficado é louca. Levantou-se do tapete de palha estendido no chão e pôs-se a gritar:

“Onde já se viu uma moça como você agora querer se rebelar! Tem tudo que deseja, o privilégio de vir de uma origem abastada, comida, água, roupa passada e vinho nos finais de semana até às 20h. Tem gajos que correm atrás e andam de joelhos à Marte para lhe fazer feliz. Ingrata! Ingrata!”

“Ingrata! Ingrata!”, gritou Shivane e Shufiane, enquanto Soymar e Soylar apoiavam a amiga cantando versos de chamamento à Feminidade.

O grupo encontrava-se divido em três mulheres para cada lado da discussão. A única que não havia se manifestado era Madame.

Após uns instantes, a filha do pastor pôs-se a suspirar. Entendia a selvageria de Syrlêi, mas vivia as crenças de Shivete. Em um mundo onde se aprende a ter o externo como referência, viver uma vida conforme nossos credos pessoais é um desafio que só os bravos se poem a encarar.

E encarar novos desafios significa estar disposto a se tornar uma nova pessoa. Romper com o conhecido do passado e se abrir para um futuro incerto, quebrar padrões de comportamento e pensamento e, muitas vezes, frustrar as expectativas sobre nós não-justamente postas por aqueles que nos cercam.

Eu acredito que ser selvagem significa ser mais de si mesmo. Significa não ser quem você está sendo para se tornar quem você realmente é, independente de gênero, idade ou etnia, sendo a intensidade de conexão e consciência que um possua com seu próprio ser o único fator limitante do nível de selvageria a ser vivenciado.

Madame nasceu aprendendo a não falar de boca cheia e sentar de coluna ereta, ir na missa todo domingo e guardar o sábado, em vez de engolir antes de falar e cuidar da postura, ir na missa quando tiver vontade e rezar como achar melhor. A moça se contentava com o mínimo e se sentia na obrigação de estar satisfeita com isso, sentindo a culpa de ser grata mesmo sentindo faltas.

“Ingrata!”, gritou Madame.

“Ingrata eu sou de não aceitar a selvageria que existe em mim e a pulsação que me leva a me tornar mais de eu mesma. Ingrata eu sou de não honrar aquilo que me faz ser única no mundo – a minha essência. Ingrata eu sou de não me agarrar à coragem que me instiga a deixar de ser só um corpo para se tornar um campo elétrico de vibrações, a deixar de ser Madame”.

Por fim, virando-se para Shivete, Shivane e Shufiane, gritou: “Ingratas!”.

*

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Foto: Ghent, Bélgica.

Sorte existe?

Só eu sei

O que eu passei

Pra chegar até aqui.

Pra chegar? Aonde?

Rosto bonito, quem vem lá. Carrega um saco de areia e um pilão pra moer semente de mostarda.

Parece que nada faz sentido até sentir.

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Era um dia frio de inverno, porque tudo começa em um dia quente de verão. Quatro da manhã, toca o despertador e ela atende a campainha. “Olá?”

“E aí, já acordou?”

“Acordei agora. Como posso ajudar?”

“É hoje, abre a porta que a sorte chegou.”

Dona Sorti entrou com tudo pela porta. Toda esbelta e elegante, vestia um casaco de pele de morcego e brincos de diamante 8 quilates. Um raio de sol refletia em seu par de orelhas, mostrando que aquela mulher não era qualquer senhora.

“Bon jour mademoiselle, hoje é seu dia de sorte”, disse a velha enquanto levantava os braços e encarava a janela atrás da anfitriã.

Persiene, sem entender nada, serviu-lhe uma xícara de chá e, abismada, permaneceu calada.

Dona Sorti então começou a caminhar pela casa, observando tudo como quem não quer nada. Mexeu aqui, vasculhou ali, abriu todas as gavetas do cômodo até encontrar o bendito documento.

“Aha! Aqui está seu presente!”

A velha então mostrou a Persiene um anel de pedra-sabão que retirara de uma caixinha no fundo do armário da TV. Era pesado, mas o sentimento ao colocá-lo em seus dedos era de leveza e alegria.

“Estava aí o tempo todo?”, perguntou a moça.

“Sim. E não.”, disse a Dona. “O meu presente sempre esteve guardado aqui, mas você nunca iria encontrá-lo pois estava fora do seu campo de visão.”

Sorti então começou a explicar porque Persiene nunca teria enxergado o anel se não tivesse ficado tanto tempo sem ele. Andando de um lado pro outro de forma animada e espalhafatosa, a velha lecionava à jovem quão importante e essencial foi a atitude da moça de assumir responsabilidade.

“O meu papel”, disse ela, “é servir como uma justificativa para aqueles que não tem nenhuma para dar em troca, e presentear aqueles que têm”.

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Era um dia frio de inverno, porque tudo começa em um dia quente de verão. Quatro da manhã, toca o despertador e ela atende a campainha. “Olá?”

“E aí, já acordou?”

“Acordei agora. Como posso ajudar?”

“Senhora, temos uma reclamação no condomínio. Seu cachorro fez suas necessidades no tapete do vizinho novamente.”

*

*

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Foto: Sydney, Australia

Entrevista de Emprego

“Então, Cleiton, conte-me mais sobre você.”

“Hmm, o que o senhor quer saber?”

“Quem é você?”

“Como assim quem sou eu?”

“Ué, qual seu nome? Idade, sexo, endereço. Hobby! Tem hobbies? O que você faz no tempo livre? Na verdade eu não ligo, por que você se inscreveu nessa vaga?”

Porque eu tenho 20 e poucos anos sem dinheiro falido pobre vivendo à custas de vento querendo ter um padrão de vida do chefe dessa empresa que é filho do dono da empresa e que saiu da fralda ganhando 20 mil reais por semana?

“Então, Cleiton, conte-me mais sobre você. Quem é você e por que se inscreveu pra essa vaga?”

“Tirando o fato de que eu não faço ideia de quem eu sou ou do que eu gosto e encontrei essa vaga no google com o título “salário promissor”, eu amo os valores dessa empresa e me identifico muito com a vaga. Sou trabalhador, homem honesto, dedicado e acredito ser o candidato ideal para o que o senhor tá procurando.”

“Cleiton, queremos saber se o seu perfil está alinhado com os planos da empresa e se há realmente um futuro pra você aqui dentro. Aonde você se vê daqui 10 anos?”

Olha moço, o senhor tá achando que eu sou o quê? Mãe Dináh? O brasileiro não tem um dia de paz e você tá me perguntando aonde eu me vejo daqui 10 anos? No fogo do inferno se tu me fizer pensar sobre isso.

“Ah! Daqui 10 anos eu me vejo trabalhando na ONU como Agente de Paz no Uzbequistão, ou sendo CEO de uma grande empresa, como o Facebook, sabe?”

“Legal, Cleiton! Parece estar alinhado com as pessoas que estamos procurando mesmo. Só tenho uma dúvida: aqui na sua Carta de Motivação, quando se inscreveu na vaga, você disse que estava ansioso para trabalhar como contador, mas nós somos um escritório de advocacia. Queria entender, houve algum engano?”

PQP. Que merda! Eu sabia que não deveria ter usado a mesma carta de motivação pras 500 vagas aleatórias que encontrei na internet. Como fui achar que mudar só o nome da empresa iria ser suficiente? Estagiário FDP que não tinha nada pra fazer e leu minha carta com calma. E ainda avisou o chefe!!

“Nossa, senhor, me desculpa. Deve ter escrito por engano. A verdade é que estou extremamente ansioso para trabalhar 12 horas por dia como advogado júnior ganhando 1.000 reais sem vale transporte nem vale alimentação assinando petição e levando cafézinho pro senhor! Quando eu começo?”


Quem somos nós e porque nos inscrevemos em vagas? Quem sou eu?

Eu achava que era A, mas agora acho que sou B. Queria ser A, tentei, mas algo me disse que eu queria ser B. Tentei ser A por um tempo (e fui), mas não me imaginava sendo A daqui 10 anos.

Daqui 10 anos, ser B parece bem mais legal. Eu sempre quis ser B, será que vou esperar 10 anos pra me torna-lo?

Nada impede que a crise venha depois, mas, na maioria das vezes, a crise dos 20 e poucos anos – que começa nos 17 – é doida e sorrateira. Por um momento, a gente consegue ignorar e fingir que nada tá acontecendo, mas de repente ela vem que nem um furacão derrubando tudo que tá na frente: que que eu quero fazer da vida?

Independente da renda financeira, cor de pele, ou gênero. mesmo se em diferentes nuances e às vezes com tópicos ou temas diferentes, todo jovem adulto enfrenta internamente essa crise.

Eu acho que só há uma maneira de enfrentá-la: Encarando-a. Aceite, viva, sinta, se questione, descubra!

Antes da pergunta brotar, a gente começa a perceber a infinidade de opções que se existe pra fazer da vida. É tanto, mas tanto trabalho diferente e maluco que existe por aí, que a gente fica mais perdido que barata tonta. Mas e se eu NÃO quiser fazer nada da vida?

É louco também dar um shift e mudar de vida totalmente. Quanto mais cedo melhor, mas nada impede que isso aconteça quando eu tiver 56 anos.

Na-da impede.

Não vou nem continuar pra não te deixar doido. Mas isso é coisa de se ficar maluco. Provavelmente terão mais textos como esse, mas por enquanto vamos todos compartilhar a dor do Cleiton de passar por mais um entrevista de emprego com a pergunta: por que se inscreveu pra essa vaga?

*

*

Foto: Ghent, Bélgica.

Dois meses em solitária

Dia 15 de março de 2020. Estávamos há um dia do evento que havíamos preparado nos últimos meses, uma simulação de Comitês da ONU. Em paralelo, a escrita da tese de mestrado e um estágio em um escritório internacional já nomeado pro Prêmio Nobel da Paz.

Murmurinhos. “Será que a gente cancela?” / “Eu acho que não, não vai chegar aqui” / “Cancela sim, é mais garantido”. O dia seguinte amanheceu com uma mensagem da coordenadora dizendo que o evento havia sido cancelado. Adiado, até, sabe-se lá quando.

Primeiro dia de quarentena. Sozinha, em países de distância do meu país. O dia em que o Abre a Janela nasceu, primeiro dia de uma grande mudança. A felicidade em poder descansar, em criar um blog, respirar, acordar mais tarde.

Primeiro dia de quarentena. Primeiro dia do quasi-apocalipse, supermercado lotado, pessoas em frenesi. Estava agora proibido se encontrar com amigos, ficar em parques, correr na rua. A regra então era ficar sozinho.

Foram tempos loucos. No começo, não deu nem pra sentir a quarentena rolando. Dias se resumiam a escrever a tese, fazer o almoço, estagiar, correr, fazer a janta. Inclusive final de semana. A vida em um mundo paralelo e unapocalíptico.

Isolamento social? Foram dois meses de quarentena a sós, longe de qualquer ser vivo. Sozinha, eu tinha 19m² de hectare e uma varandinha inóspita no meio do frio neerlandês. Vivendo um sonho, eu nem enxergava os dias passarem. Não sentia a falta de nada, não queria falar com ninguém. Meu único objetivo era fazer o que eu tinha que fazer e não me deixar chegar a exaustão. Foi quasi-burnout.

Dois meses sem falar com ninguém pessoalmente. Sabe o que é isso?

Uma experiência maluca, uma oportunidade de crescimento e evolução. Não que eu recomenda, mas, se eu fosse médica, prescreveria.

Ter foco deixa a gente anestesiado. Mergulhei em um processo de estudo sobre desenvolvimento pessoal e autoconhecimento, me joguei nas águas do meu oceano sem pressa pra voltar à superfície. Mesmo durante o burnout, o isolamento social trouxe uma paz mental jamais sentida antes. Não me senti sozinha em nenhum momento durante esse período.

Até sentir tudo de uma vez.

Ficar dois meses sem contato humano -nenhum- foi um processo destrutivo e construtivo ao mesmo tempo. Me levou a um estado de autossuficiência que me fez duvidar da necessidade de interação social. Eu me dei uma festa de aniversário em que eu fui a única convidada e foi uma das melhores festas que eu já fui, sério.

Sinto o impacto desse retiro espiritual moderno até hoje, e sei que ainda estou me recuperando. Procurando um equilíbrio entre o meu eu solitário e o meu eu social. Entre o meu impulso instintivo de mergulhar no meu mundo e minha resistência/vontade de sair pro universo social. É tão confortável aqui dentro, sabe. Zona de conforto?

Lembro da primeira vez que me reuni com amigos depois desses dois meses. Foi caótico e um pouco desesperador lidar com tanta energia diferente. De repente, eu não sabia mais estar em um ambiente barulhento e normal. Esse dia foi phoda.

Acho que hoje eu entendo quem resolve se demitir do emprego, jogar a família pro alto e correr pra um monastério nas montanhas do Himalaia. De certa forma, entendo o Aubrey Marcus ter ficado uma semana sozinho em um quarto escuro, ou o McConaughey ter cogitado virar monge.

Cada dose de solitude são 50ml de autoconhecimento. Cuidado para não beber muito, mas uma tacinha de vinho por dia não faz mal a ninguém. Quem consegue tomar a garrafa inteira de uma vez?

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Foto: Normandia, França.

Ménage à quatre

Eu não falo francês ainda pra saber se é verdade ou não, mas, de acordo com o oráculo Google, “ménage” significa 1. domicílio familiar, moradia, lar e 2. o conjunto de tarefas rotineiras e afazeres relacionados com a casa. Mantenha isso em mente.

Também de acordo com o Google, “indivíduo” significa não dividual, indiviso. Mas isso é mentira e eu posso provar.

Imagine você que Beyoncè e Jay-Z são pessoas reais e cheias de crise existencial como qualquer um de nós. Que eles são um casal normal, vivem escondidos nas profundezas da vida social normal de qualquer tiozão casado com filho com sonhos ainda não alcançados, e que ainda não descobriram a fórmula secreta que mistura beleza + dinheiro + fama + não necessariamente felizes + habilidade surreal pra cantar.

Imagine que Beyoncè tem uns 20 anos e conheceu Jay-Z em um rolê normal em uma festa universitária qualquer e crie seu encontro romântico perfeito a partir daqui. Os dois começaram a flertar, tudo são flores, declaração de amor no Face, pegação constrangedora na festa de família etc. Nada que um começo de namoro de outros casais apaixonados por ai não tenha tido.

O tempo passa e os dois continuam tendo um relacionamento amoroso. Se formam na faculdade e, um tempo depois, vão morar juntos.

Beyoncè e Jay-Z são duas pessoas individuais que, juntos, formam um casal. Para se formar um casal, no mínimo, precisa-se de duas pessoas. Mas, na verdade, a Beyoncè sozinha já é duas pessoas, e Jay-Z sozinho já é duas pessoas.

Juntos, eles são quatro pessoas. Wut?

O meu namorado na vida real – que não é o Jay-Z – costumava reclamar que, além de me namorar, ele namora também a minha “cabeça” (como se eu não tivesse que namorar a dele, né, mas ok). Ele reclamava que ele namorava eu & também minhas inseguranças. Que quando a gente discutia, ele tinha que conversar comigo & com meus pensamentos de dúvida/insegurança que voltavam de vez em quando.

Muitas vezes (eu diria sempre), brigas não são entre os dois indivíduos que formam o casal. Brigas podem ser entre a própria Beyoncè e suas inseguranças, que se externalizam em um evento aleatório de conflito com Jay-Z (que pode ficar inseguro e brigar com seus pensamentos também).

Um relacionamento de duas pessoas é, na verdade, um relacionamento entre quatro. Minha Alma & Meu Ego + A Alma Dele/a + O Ego Dele/a.

Morar junto, então, é um verdadeiro ménage. Ménage à quatro, uma mistura de tarefas domésticas, uma mistura de dois indivíduos individuais com inúmeros afazeres rotineiros e que juntos formam um lar.

Independente de que idade ou sexo seja você ou seu parceiro/a, estar em um relacionamento com outra pessoa é estar em um relacionamento com a cabeça dela também. Com as lutas e inseguranças dela também. É saber que, quando ela estiver brigando com você, na verdade vai estar brigando com a outra parte dela mesmo.

Indivíduos são sim divisíveis. Uma hora eu posso ser minha parte positiva, e outra hora eu posso ser minha parte negativa. E o lado positivo somado ao negativo forma um ser só, fisicamente.

Principalmente agora que Beyoncè e Jay-Z moram juntos, eles vão ter que entender que um vai namorar a insegurança do outro. Vão ter que aprender a se respeitar, a abrir espaço para a individualidade dupla de cada um, e se virar nos trinta pra fazer dar certo esse ménage à quatre.

É… complexa essa história de relacionamento amoroso.

Imagina fazer um ménage à quatre à troi?

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Nota da escritora: para qualquer pessoa que estiver lendo isso, principalmente o meu namorado atual que eu gostaria que fosse mas não é o Matthew McGonaughey: ajude em casa!!! Se você usa a sua casa tanto quanto o seu parceiro/a, divida e *cumpra* suas tarefas domésticas! Bjs 😉

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Foto: Praia da Gamboa, Bahia – Brasil